Ana Claudia Favano, especialista em Psicologia Positiva e educadora da Escola Internacional de Alphaville
A proibição do
uso de celulares nas salas de aula tornou-se o tema central dos debates na área
da educação. Seguindo uma tendência internacional adotada por países como a
França, Espanha, Grécia, Suíça e México, o Brasil vai proibir os aparelhos do
cotidiano escolar. Mas a questão vai muito além de proibir ou permitir: é
necessário refletir sobre como integrar os dispositivos ao ambiente escolar sem
comprometer os pilares da formação pedagógica, sócio emocional e ética das
crianças e adolescentes.
Celulares
permitem acessar informações em tempo real, promovem a inclusão de alunos com
necessidades específicas e enriquecem as práticas pedagógicas, por exemplo. A
tecnologia, quando bem utilizada, é uma ferramenta poderosa; e a inteligência
artificial é uma grande aliada em muitos aspectos. Mas o uso inadequado e sem
propósito definido de celulares traz prejuízos inegáveis. A tecnologia quando
usada para a interação, não substitui o vínculo afetivo das interações frente a
frente e olho no olho, que desenvolve as habilidades humanas fundamentais, como
a empatia, compaixão e de comunicação assertiva.
Estudos
científicos apontam que o excesso de telas reduz a criatividade, prejudica a
capacidade de atenção, causa estresse, distúrbios de sono, irritação,
isolamento social e muitas vezes, se torna um catalisador de problemas como a
dependência digital. Também está relacionado o aumento de casos de violência
como o bullying e o cyberbullying, além de comportamentos antissociais,
impactando diretamente o desenvolvimento emocional das novas gerações. Em casos
extremos, como reflexo do uso desmedido dos aparelhos em casa, crianças e
jovens chegam à escola apresentando sintomas de abstinência digital.
A discussão do
tema precisa ser vista sob uma perspectiva ampla, que considera tanto os
benefícios quanto os prejuízos que a tecnologia pode trazer ao desenvolvimento
humano. Nesse sentido, a regulamentação do uso de celulares é um passo
importante, mas não é suficiente, pois, no contexto escolar, a dependência
digital não é apenas um problema tecnológico, mas também uma questão moral e
ética e deve se iniciar em casa com as famílias ajustando os seus próprios
limites e rotinas.
É urgente educar
as novas e futuras gerações para o uso consciente dos dispositivos e
principalmente das mídias sociais. Para crianças menores de 10 anos, substituir
os dispositivos por atividades físicas e interações sociais é fundamental para
estimular habilidades críticas e a criatividade. Isso também se deve ao fato do
desenvolvimento do cérebro, que é impactado profundamente quando nossas
crianças e jovens são expostas ao ambiente digital. O não conhecimento desses
impactos, faz com que as pessoas minimizem e desconsiderem as consequências
futuras, que são gravíssimas e comprovadas cientificamente como preocupantes.
Já para os
alunos mais velhos, a autorregulação e o uso pedagógico supervisionado são
indispensáveis. Porém existe um período na adolescência em que o cérebro dos
jovens estão em grande produção de conexões neurais, que não podem ser
desprezada com o uso abusivo desses dispositivos. O uso de estratégias
educativas e éticas, são fundamentais para prevenir esses danos, pois agem de
forma preventiva, capacitando os jovens a identificação dos riscos online, e a
reagir frente a interações com desconhecidos em jogos e a situações de assédio,
entre outras exposições perigosas e desnecessárias.
Programas que
integram a convivência mora; e ética, a psicologia positiva a formação de
caráter são nossas aliadas frente a esse quadro e nos ajuda a criar as
estratégias curriculares e intervenções positivas que os levam a experiências
enriquecedoras na rotina escolar. Os alunos desenvolverem uma relação saudável
com o digital, se tornam aptos a identificar ambientes vulneráveis e seus
perigos, e são capacitados a fugir dessas armadilhas digitais.
Ao desenvolverem
autoconhecimento, resiliência e capacidade de autorregulação, os alunos se
tornam aptos a equilibrar o uso da tecnologia com as demandas do mundo real.
Nesse sentido, a proposta de saúde mental dos projetos legislativos, que inclui
o acolhimento de alunos e a capacitação de professores, é essencial para
enfrentar os desafios trazidos pela tecnologia.
É no equilíbrio
que se encontra a solução para o dilema dos celulares em sala de aula. Basta
lembrarmos que tablets, notebooks e lousas digitais são usados em sala de aula
há um bom tempo, e trouxeram inovação tecnológica para os ambientes acadêmicos.
Não se trata apenas de restringir ou liberar, mas de criar um ambiente onde a
tecnologia seja uma ferramenta e não um obstáculo ao aprendizado e ao
desenvolvimento humano.
E também, e
talvez o mais importante é certificarmos que o uso desses dispositivos está bem
claro e com um propósito muito bem definido. Bem diferente do uso sem
propósito, quando eles passam horas e horas rolando as telas, passando de uma
tela para outra tela, ou jogando, sem sequer se dar conta do tempo que foi
literalmente perdido.
É nosso papel,
como educadores, formar indivíduos que, não apenas dominem as ferramentas
tecnológicas, mas que também saibam viver de forma ética, criativa e conectada
com os valores universais e humanos. O uso ou proibição de celulares na escola
exige uma transformação cultural na maneira como educamos nossas crianças e
jovens para lidar com o mundo digital. Afinal, a educação deve sempre priorizar
aquilo que nos torna, acima de tudo, seres sociais: nossa capacidade de pensar,
sentir e transformar o mundo ao nosso redor.
Ana Claudia Favano é gestora da Escola Internacional de Alphaville. É psicóloga; pedagoga; educadora parental pela Positive Discipline Association/PDA, dos Estados Unidos; e certificada em Strength Coach pela Gallup. Especialista em Psicologia da Moralidade, Psicologia Positiva, Ciência do Bem-Estar e Autorrealização, Educação Emocional Positiva e Convivência Ética. Dedicada à leitura e interessada por questões morais, éticas, políticas, e mobiliza grande parte de sua energia para contribuir com a formação de gerações comprometidas e responsáveis.
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